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Ontem à noite dando uma revisada nas minhas notas e rascunhos eu encontrei esse texto que escrevi tempos atrás e que foi pro Facebook. Me motivei a escrevê-lo quando passava pela frente de um prédio público muito conhecido em Porto Alegre e que naquele momento me dei conta que de certa forma marcava um pouco a minha trajetória de vida, ainda que eu só tenha acessado ele no episódio mencionado no texto. Texto que nasceu de um misto de nostalgia de quem mora longe e visita a terra natal com a epifania que só o tempo é capaz de trazer sobre uma lembrança nada mais do que trivial. Resolvi trazer o texto pra cá pra não que ele não seja perdido de vista novamente, quem sabe, como aconteceu comigo, acrescentando algo também a quem aparece por aqui eventualmente.
Tenho certeza de que o ano era 1997 ou 1998, um dos dois. Portanto eu tinha 13 ou 14 anos e minha mãe trabalhava no CAFF — Centro Administrativo Fernando Ferrari. Esse edifício do fundo da foto que é conhecido em Porto Alegre como “aquele que parece uma pista de skate”. Quem um dia subiu num skate e nunca pensou nisso e morava na região metropolitana de Porto Alegre definitivamente não olhou direito pra ele. A mãe me convidou pra ir até lá para almoçarmos juntos e eu poder conhecer o trabalho dela. Também tenho quase certeza de que o mês era dezembro pois eu estudava de manhã e saí mais cedo da escola por conta da distância pois do contrário não chegaria a tempo do almoço. E pra eu sair mais cedo da escola pra isso é bem provável que eu já estava com as notas todas resolvidas e só cumprindo tabela nos últimos dias letivos.
Pois bem, me aprontei pra encontrar a mãe que já estava lá desde cedo, obviamente. Calcei meu único par de sapatos e vesti a única camisa social, comprados pra ir ao casamento de uma vizinha meses atrás. Afinal, se tratava de um ambiente de trabalho, pensei: “sabe como é, logo mais eu vou começar a procurar emprego, nunca se sabe, melhor causar uma boa impressão”. Hoje eu sei que a chance era zero de qualquer oportunidade surgir daquela situação, mas é assim que a gente que sabe que precisa aproveitar as poucas oportunidades que a vida dá aprende a encarar as coisas desde muito cedo. Enfim.
Foi assim que quase como brincando de adulto, acordei cedo, me arrumei social, passei gel no cabelo pra ficar bem penteado e rumei para… a escola. Devo ter chamado mais atenção do que aluno do fundão tirando 10 em matemática. Como planejado, saí mais cedo e peguei os dois ônibus para enfrentar os mais de 20 quilômetros de distância até o meu destino. Chegando lá, a mãe me mostrou o prédio, falou um pouco da rotina, me apresentou para outras colegas, para desespero e total constrangimento do meu eu adolescente. No caminho de ida e de volta até o restaurante onde comemos, se não me falha a memória, uma “ala minuta”, a mãe fazia um pouco o papel de guia turística, outro pouco o de guia vocacional.
“Aquele prédio marrom e redondo é a PROCERGS, eles trabalham com processamento de dados e computadores, dizem que é uma profissão de futuro, filho”.
“Tá vendo ali? É o colégio Parobé, ele é excelente, é uma escola técnica também, os alunos já se formam sabendo uma profissão, é bem concorrido, tem até que fazer prova pra entrar”.
Deu a hora dela voltar pro trabalho e eu para casa. Um passeio simples e corriqueiro alguém poderia dizer. Mas pra mim aquele dia foi uma espécie de emancipação. Uma tímida iniciação do ritual de passagem para a vida de adulto responsável que me aguardava não muito tempo depois disso, ainda adolescente. Me aventurar sozinho pela cidade, em um território completamente novo, com vestimenta de adulto, num grande centro corporativo em dia útil. Foi a primeira vez que senti que estava cuidando de mim mesmo.
Mas a grande lição daquele dia eu acho que só entendi ao passar novamente, 20 anos depois, pela pracinha que cruzamos caminhando aquele dia, que diferentemente da foto, estava ensolarado. Entendi que os conselhos que eu recebi naquela conversa trivial e que talvez eu nem os tenha percebido de cara como conselhos, acabaram de um jeito ou de outro sendo seguidos. Foram como sementes que são plantadas na terra e nem mesmo quem plantou nem muito menos a árvore em potencial tem ideia se irão germinar, crescer e frutificar.
Pouco tempo depois eu resolvi fazer a prova para seguir o ensino médio em uma escola técnica, não no Parobé, mas em outra ótima escola estadual mais perto de casa. O primeiro emprego, e vários outros, não foram naquele prédio redondo e marrom, mas em outras empresas do então chamado “processamento de dados”, que a propósito, foi o curso técnico escolhido. Mas algumas coisas sim seguiram outro rumo com o tempo. Eu descobri que não curto muito roupa social e eu não uso mais gel no cabelo. Ainda bem.
Mamãe fez um bom trabalho com as sementes aquele dia, a árvore segue crescendo e dando frutos muito agradecida❤️.
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